quarta-feira, 9 de março de 2011

O negro no mercado de trabalho


A constituição do mercado de trabalho no Brasil foi pensada de forma racializada. A população negra foi excluída por ser considerada racialmente inferior, portanto inviável para um país moderno. O mesmo negro que foi fundamental com a força de seu trabalho para o desenvolvimento econômico e construção da nação durante séculos de escravidão, passou a ser visto como um entrave para a nova ordem social advinda da abolição da escravatura.

Em 1872 o percentual de escravos no total da população brasileira era de apenas 15,2%. Este fato coloca um primeiro elemento importante, que é a convivência de dois tipos de trabalho: o trabalho escravo e o trabalho livre bem antes da abolição, sendo importante citar que os negros representavam 58%, os brancos 38,1% e outros 3,9% de brasileiros naquele período.

O discurso racista de inferioridade racial, associado aos males da escravidão(monocultura, latifúndio,etc...) e as teorias do racismo científico(uma raça superior a outra) apontavam para a inviabilidade de uma nação com população negra e mestiça, que estaria fadada ao fracasso. Daí a surgir a teoria do branqueamento foi um passo., pois os racistas achavam que o Brasil só teria progresso através do embranquecimento de sua população. Houve também uma preocupação de educar o negro moralmente para o trabalho livre com o objetivo de induzi-lo a considerar o branco como seu superior. Some-se a isso a ideologia da vadiagem que tinha como objetivo a vigilância, repressão e desqualificação dos afro-descendentes que transformava a ausência de emprego em uma opção do negro para não trabalhar considerando-o inapto ao trabalho em termos morais.

É bom relembrar que em função da teoria do branqueamento foi criada a figura do imigrante desejado, normalmente europeus brancos que tinham políticas de ações afirmativas como doação de terras e outros mecanismos de incentivo a imigração e por outro lado à imigração indesejada que dificultava e até chegava a proibir a entrada de africanos e afro-descendentes em alguns casos no Brasil, além da Lei da Terra de 1850,que proibia descendentes de quilombolas de assumirem a posse de áreas onde viviam e que só foi revogada pela atual constituição de 1988.

Ao fazer esta retrospectiva não fica difícil entender a atual situação dos afro-descendentes, vítimas de uma política deliberada de exclusão social principalmente em função do racismo ainda hoje lamentavelmente existente.

O Brasil é signatário da Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho-OIT que trata da discriminação racial no mercado de trabalho, porém as centrais sindicais denunciaram nosso país a OIT em 1992, por não cumprimento de algumas cláusulas. A Constituição Federal no seu artigo 3° inciso IV, a lei 7716(Lei Caó) e a Lei 9029 proíbem e criminalizam a discriminação no acesso ao emprego.

Várias pesquisas de institutos e fundações sérias ( IDH, IPEA, DIEESE, IBGE/PNAD, SINE, FGV, etc...) revelam o negro em desvantagem salarial em relação ao branco, o que nos leva a afirmar que as desigualdades passam indubitavelmente pela questão racial, que inclusive é mais forte que a do gênero pois o homem e a mulher negra ganham menos que a mulher branca quando ocupam a mesma função. Dentro das quinhentas maiores empresas do país, negros somam 23,4% dos funcionários, 13.5% com cargos de chefia, 8.8% gerentes e 1,8% executivos conforme pesquisa Instituto Ethos/ Fundação Getúlio Vargas. Na percepção de 1% das empresas não há negros nem entre funcionários.

Pertencer a uma família menos numerosa, ter mais acesso a educação formal, maior permanência na escola, são alguns dos fatores que contribuem para a configuração das desigualdades. Mesmo com origens idênticas, negros e brancos tem desempenhos diferentes, pois a educação atua como importante variável, porém não explica as diferenças de distribuição de renda quando o nível educacional é o mesmo. O Brasil dos brancos com Índice de Desenvolvimento Humano- IDH ocupando o 46° lugar e dos negros a 107° posição é prova inconteste da desigualdade racial. Segundo o Centro de Estudos das Relações do Trabalho e Desigualdades- CERT, pelo menos 6 de cada 10 casos de discriminação racial registrados em delegacias de São Paulo são em relação ao processo de admissão/ demissão. O requisito da boa aparência é um dos mecanismos criados para impedir o acesso de afro-descendentes no mercado de trabalho.

Cabe ao Estado um papel ativo e propositivo na questão racial, não basta dizer que o racismo é crime, efetivamente há que se implementar políticas específicas de ações afirmativas que contemplem a diversidade racial, pois a sociedade é heterogênea e a mesma deveria refletir isso, nesse cenário, políticas públicas que diminuam as diferenças estruturais como a baixa escolaridade e, ao mesmo tempo, conscientizarem a população da existência da discriminação ganham importância , de forma a garantir que a inserção e as oportunidades no mercado de trabalho ocorram de forma igualitária e justa, e para atingir este objetivo é necessário privilegiar os que sempre foram desprivilegiados , como é o caso da mulher negra que hoje infelizmente compõe a base da pirâmide no processo de exclusão social pois sofre os preconceitos de gênero e raça.

Ivaldo Paixão
Coordenador Político do Movimento Negro Unificado

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